Nos últimos dias estamos vendo uma
onda de manifestações e protestos que varrem o país. São reivindicações em sua
maior parte de natureza social e política, sobretudo transporte, educação e
saúde. Também podemos ver algumas causas de natureza religiosa e também para a propagada
“liberdade sexual”. Outras como, “quero uma bolsa Louis Vuitton” ou “vendo
Palio 98” não faziam o menor sentido ou só tinha sentido para o manifestante. Mas
em um momento como esse, muitos cidadãos são incentivados a expressarem toda a
sua indignação com o poder público que ora governa o nosso país. O alvo
principal, não poderia deixar de ser, é a classe política. A artilharia é
pesada contra todos os políticos independentemente dos partidos a que são
filiados. A corrupção instalada em nossa nação e a impunidade afrontam as
pessoas de bem, que pagam seus impostos e trabalham duro para ter um pouco de
dignidade. A parte lamentável é o oportunismo de bandidos disfarçados de
manifestantes fazendo todo o tipo de vandalismo, roubo e agressão. É óbvio que
em uma manifestação política, as chances de haver conflitos com as forças de
repressão são muito grandes, mas algumas vezes parece que a coisa é manipulada,
é tramada para enfraquecer o próprio movimento, afinal, não é todo mundo que
tem a coragem de ir às ruas sabendo que vai encontrar uma situação de
vandalismo e violência.
E
os cristãos como ficam nisso tudo? Os cristãos não podem esquecer que são desse
planeta e que as consequências desses movimentos afetarão a todos os
brasileiros, independentemente de religião. Portanto, se manifestar a favor e
participar dos protestos é uma postura legítima, assim também como é legítimo ser
contra e não participar; isso é democracia. A ressalva é que, ao protestarmos, não
devemos esquecer que não podemos ir com a multidão se esta contradisser a nossa
postura cristã. Não podemos esquecer que antes do Brasil, a nossa pátria está
no céu, temos a cidadania celestial que é a que deve ser a que mais nos move e
pela qual devemos embasar toda a nossa liberdade de expressão.
Jesus,
o nosso maior exemplo, repreendeu com veemência as autoridades constituídas pelos
seus comportamentos, os quais não condiziam com os seus cargos (Mateus 23),
porém, ele não perdeu o foco de sua missão e muito menos sua serenidade e
santidade. Mas Jesus tinha um propósito firme e talvez o que nos falta seja
justamente isso, um propósito, um ideal, não digo um sonho, para deixar no
campo do que parece ser mais próximo, pois um ideal aparenta ser mais objetivo,
mais palpável, algo que se inicia agora, neste mundo. Até devemos sonhar, mas
não podemos continuar dormindo em berço esplêndido. Dessas manifestações é isso
o que me encanta, pelo menos aparentemente, as pessoas recuperaram um pouco
daquilo que elas acreditam que deva fazer mais sentido para as suas vidas a
ponto de saírem do sofá e ir às ruas protestar. Talvez seja justamente isso que
esteja faltando no cristianismo nos dias de hoje. Algo mais profundo, real, que
nos tire do nosso comodismo, da nossa zona de conforto e também nos permita
resistir às maiores tribulações e à nossa tentação de achar que existe um mundo
fora e outro dentro da igreja.
Soren Kierkegaard,
filósofo e teólogo dinamarquês, acreditava que era só fazendo um compromisso pessoal autêntico que
o ser humano alcançaria a sabedoria e encheria sua vida de significado. Será
que não nos falta esse compromisso? Será
que estamos nos contentando com o “aceito Jesus”? Parafraseando Evgeny Morozov,
autor do livro “A
desilusão com a rede: o lado obscuro da liberdade na internet”, um mundo em que
professar o comprometimento pessoal com o cristianismo não requer mais do que
redigir um status religiosamente consciente de Facebook, teria despertado em Jesus
a mais profunda misericórdia.